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Narrativas biográficas ajudam a compreender fenômenos do trabalho

Crédito: Brett Jordan, Unsplash

Histórias de vida trazem não só informações individuais, mas também elementos sociais, culturais, além da contextualização do tempo histórico e econômico. Desde a formação do núcleo HFACTORS, o método que utiliza narrativas biográficas tem sido usado para entender fenômenos do trabalho a partir dos próprios trabalhadores. Os pesquisadores do grupo de Sociologia entrevistam pessoas inseridas no ambiente estudado e perguntam sobre suas trajetórias desde a infância, passando pela escolha profissional, inserção no mercado e construção de carreira.

Essa abordagem, segundo o coordenador da equipe de Sociologia, Hermílio Santos, auxilia no diagnóstico de campo, porque, quando um colaborador ingressa em uma organização, carrega com ele interpretações passadas e visões de mundo, que ajudam a informar a maneira como agirá. “A análise transborda o ambiente concreto, porque as vivências não se encerram em si. Elas têm um histórico”, explica. 

Na prática, a entrevista começa com uma pergunta aberta solicitando que a pessoa conte sobre sua biografia. Esse primeiro relato é feito de forma livre sem interrupções. Após o entrevistado sinalizar que finalizou, o entrevistador retoma cada um dos temas abordados, procurando obter narrativas de experiências vividas. “Narrativa é um tipo de texto que tem um percurso cronológico”, explica a historiadora e pesquisadora do núcleo Naida Menezes. É como se fosse uma cena de filme em que o ouvinte consegue imaginar o ambiente e o que aconteceu. Esse texto difere da avaliação e da argumentação. “O que queremos nessa forma de pesquisa são vivências concretas, não a opinião ou o julgamento dos entrevistados”, complementa Menezes, que é pós-doutoranda em Sociologia. 

Na fase de análise, os pesquisadores procuram diferenciar as informações sobre as vivências e as que são passadas como interesse de apresentação, muitas vezes influenciado pelo contexto da entrevista. “No ambiente de trabalho, é comum que o entrevistado procure atender às expectativas do empregador e direcione sua fala para a conformidade às regras da empresa”, destaca a jornalista e pesquisadora Karina Reif. Apesar ser difícil de evitar que isso aconteça, é possível minimizar fazendo entrevistas com sigilo e formulando questões que não orientem o discurso. “As perguntas muito fechadas ou aquelas em que o entrevistado só pode responder sim ou não restringem o que pode ser obtido no momento da entrevista.”

Fatores Humanos 

Esse método é um dos utilizados pelo grupo de Sociologia, combinado com a etnografia por meio da observação participante. Dentro do núcleo HFACTORS, outras ferramentas também auxiliam na compreensão dos temas investigados, como questionários, storytelling, grupos focais, entre outros. Todas essas técnicas têm vínculo com a abordagem de Fatores Humanos

“A área de Fatores Humanos tenta entender as diferentes práticas que fazem uma organização existir, que a constroem e que a colocam para frente”, declara a psicóloga e pós-doutoranda de Sociologia Priscila Susin.

É uma abordagem descritiva, segundo ela, que tenta olhar e dizer como um sistema é composto de diversas partes em interação. “Tenta mostrar como as diferentes partes desse sistema funcionam, mas mais do que isso, tenta entender como essas partes se comunicam, como elas coexistem e constroem juntas.” 

Dessa maneira, as narrativas ajudam a visualizar como as práticas dos indivíduos ocorrem no cotidiano e como eles interagem com outros indivíduos, com o trabalho e com a organização, além de outros aspectos. Isso tudo do ponto de vista dos próprios entrevistados. 

Efeito terapêutico

Como os trabalhadores são ouvidos de uma maneira mais livre e aberta, os pesquisadores observam um efeito para além da pesquisa. “Os trabalhadores sentem que estão sendo considerados e respeitados como participantes e como criadores”, salienta Menezes. 

Esse “efeito terapêutico” já foi explicitado em outros estudos e continua sendo verificado nos trabalhos realizados pelo HFACTORS. “Muitas vezes, as pessoas não têm um espaço para falar de algumas questões e se abrir. Com esse método, a gente está falando: ‘é tudo sobre você, não vamos julgar, não vamos interromper, nem impor o que é certo ou errado’”, explica Susin. 

Divulgação dos resultados 

A maneira de transmitir os resultados desse tipo de pesquisa pode ser por relatórios e apresentações, por exemplo. Contudo, o HFACTORS têm complementado esses formatos mais tradicionais com materiais audiovisuais. Segundo a jornalista e pós-doutoranda em Ciências Sociais Kamila Almeida, esse recurso possibilita que as temáticas sejam explicitadas de forma atrativa e educativa. Os vídeos são usados na fase de intervenção das pesquisas junto aos trabalhadores. 

Almeida e Santos também estão trabalhando em um documentário que funcionará como um retrato concreto de alguns aspectos do ambiente laboral do setor de óleo e gás, que é foco de uma das pesquisas desenvolvidas pelo núcleo. 

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