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Salvatagem garante recursos para sobreviver em caso de acidentes

Quem trabalha embarcado precisa estar preparado para qualquer imprevisto a bordo devido ao alto risco da atividade offshore. Para isso, existem treinamentos e certificações regulares. Uma delas é o Curso Básico de Segurança de Plataforma (CBSP), necessário há cada cinco anos. Boa parte dos pesquisadores do HFACTORS já passaram pelas aulas teóricas e práticas com o objetivo de sobreviver em caso de acidente em alto mar.

As pós-doutorandas Karina ReifNaida Menezes e Priscila Susin renovaram o CBSP, conhecido como salvatagem, nos últimos dias para realizar atividades de pesquisa em uma Unidade Flutuante de Produção, Armazenamento e Transferência (FPSO), na costa brasileira. Já a pesquisadora Jane L. Santos e a pós-doutoranda Caroline Capaverde passaram pela experiência pela primeira vez.

Segundo o instrutor da RelyOn Nutec (Brasil)Wolmer Vieira, o principal objetivo desse tipo de treinamento é a salvaguarda da vida humana por meio de técnicas para reação, o mais breve possível, durante situações de risco. “É preciso ter consciência sobre os equipamentos disponíveis a bordo. Saber onde estão e como usá-los”, destaca, ressaltando a importância de os trabalhadores se manterem flutuando na superfície, caso necessitem deixar a plataforma em um caso de emergência.

Na salvatagem, os alunos são capacitados a diferenciar e usar extintores de incêndio, mangueiras, coletes salva-vidas, além de reconhecer e empregar plano de fuga. Na piscina, os ensinamentos são voltados para a maneira de saltar de uma plataforma de forma segura, usar o bote, sinalizar o pedido de ajuda, manter o calor e a estabilidade do grupo.

Em razão das características do trabalho embarcado, a sobrevivência vai depender da manutenção dos ensinamentos a partir de centros de treinamento onshore, mas também de simulações realizadas nas próprias embarcações. “Por mais que o treinamento seja o mais próximo da realidade, as atividades realizadas no centro são controladas e os riscos mitigados”, explica. 

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HFACTORS inicia mais uma pesquisa na área de óleo e gás

Os pesquisadores do HFACTORS, ampliando sua área de atuação em Fatores Humanos, estão desenvolvendo um projeto para o fortalecimento da cultura de segurança da Karoon Energy Brasil, uma empresa internacional de exploração e produção de petróleo e gás com ativos no Brasil e Austrália.   

Desde 2014, o HFACTORS estuda e desenvolve soluções em Fatores Humanos, principalmente com foco em segurança, em sistemas sociotécnicos complexos. A experiência em áreas como exploração de petróleo, aviação e saúde vem consolidando o conhecimento da equipe.

“A ideia é fazer um diagnóstico da empresa no contexto de fatores humanos. Em uma segunda etapa, haverá sensibilização sobre essa abordagem”, explica o coordenador do núcleo HFACTORS, Eduardo Giugliani.

Para a coleta de dados, serão realizadas entrevistas, oficinas colaborativas, observação e análise de operações em campo, com embarque de pesquisadores em plataformas de petróleo em alto mar, na costa brasileira.

Nesta pesquisa, que iniciou em abril e tem duração prevista de 15 meses, a equipe é formada por pelo menos 15 profissionais, com formação interdisciplinar, com foco em engenharia, resiliência e ciências sociais aplicadas. A liderança deste projeto cabe à Escola Politécnica e à Escola de Negócios da PUCRS, incluindo pesquisadores de outras áreas.

Ao final do trabalho, o grupo tem expectativa de reunir informações e conhecimentos sobre os atores e as dinâmicas organizacionais que possam contribuir com a melhoria do desempenho em segurança da Karoon Energy. Os avanços do projeto serão conquistados com base em conceitos de pesquisa-ação, quando os pesquisadores do HFACTORS trabalham em conjunto com os colaboradores da empresa, construindo soluções e proposições de forma compartilhada.

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Pós-graduação sobre Fatores Humanos inicia na PUCRS

PUCRS inicia na próxima segunda-feira (26) uma pós-graduação para aprofundar conhecimentos de cultura de segurança. O conteúdo, ministrado por especialistas nacionais e internacionais, é focado em conceitos de Fatores Humanos – uma abordagem que considera principalmente as condições que influenciam o comportamento no trabalho, o desempenho e a segurança – e resiliência organizacional. 

O curso, considerado pioneiro na área, terá duração de 15 meses para uma primeira turma formada por profissionais da Petrobras e da Transpetro. No ano que vem, já está prevista uma segunda edição.

Os professores da PUCRS Eder Henriqson e Eduardo Giugliani coordenam o projeto em parceria com o engenheiro de petróleo da Petrobras Jose Carlos Bruno, diretor da Seção Técnica de Fatores Humanos da SPE – Society of Petroleum Engineers. O curso é liderado pela Escola de Negócios junto com a Escola Politécnica da PUCRS.

Para mais informações, entre em contato pelo e-mail [email protected]

CIÊNCIA DE DADOS: Dados ajudam a compor modelos para alertar sobre riscos

Transformando informações coletadas em conhecimento útil e aplicável, a Ciência de Dados é uma ferramenta para projetos de pesquisa e até para empresas. Dos dados, é possível extrair ideias para solução de problemas e respostas para diversos tipos de organizações.

Conforme a doutora em Engenheira e Gestão do Conhecimento Viviane Schneider, a Ciência de Dados é uma área da Engenharia e Gestão do Conhecimento. Ela explica que soluções metodológicas ou tecnológicas podem ser identificadas e servir para criar mais vantagem competitiva para empresas e também facilitar o trabalho dos colaboradores, além de explicitar conhecimento e fazer com que ele não seja retido ou perdido.

“Tentamos transformar todos os dados disponíveis em conhecimento específico, que possa instrumentalizar os gestores e os operadores e que seja útil”, afirma. Essa área identifica conhecimentos em fontes diversas, como relatórios, por exemplo. Com técnicas de inteligência artificial, os pesquisadores podem “minerar” documentos para obter elementos que contribuíram para a criação de uma ferramenta, por exemplo.

No caso de indústrias complexas que têm o objetivo de tornar o ambiente de trabalho mais seguro, a pesquisadora cita exemplos de aplicação, como alertas a partir da indicação de algum fator de risco monitorado por sensores, que podem ser os mais variados, como condições do clima, sintomas de estresse de colaboradores, entre outros. Também é possível identificar informações necessárias em tempo real para desenvolver alguma operação específica e disponibilizá-las de forma mais eficiente.

A equipe em que a cientista de dados trabalha está desenvolvendo um protótipo com a finalidade de identificar fatores humanos lidados a situações de risco. Essas informações ajudam a calibrar um algoritmo capaz de alertar sobre características de determinado contexto que possam mostrar insegurança. Contudo, ressalta que a obtenção e reunião de dados são, muitas vezes, sensíveis, por vários motivos, incluindo éticos, o que dificulta a criação de um modelo, mas não impede que se desenvolva o instrumento e que a própria organização coloque em prática.

A Ciência de Dados é uma das áreas de pesquisa que integra o núcleo HFACTORS, o qual conta com quase 40 profissionais de diferentes formações. Cada grupo atua a partir de uma perspectiva de estudos, mas todos procuram integrar seus conhecimentos em torno de um objetivo comum de pesquisa.

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LINGUÍSTICA: Foco na comunicação pode contribuir para a segurança em operações

Em sistemas sociotécnicos complexos, os acidentes ou incidentes acontecem, normalmente, por mais de uma razão. Por isso, quando se trabalha com o objetivo de melhorar a segurança, a intenção é minimizar os fatores de risco, que podem ser ambientais, comportamentais ou técnicos.  A comunicação, por exemplo, permeia todas as operações em termos de interação e de identificação de problemas. “A questão é tentar controlar esses fatores de risco e tentar otimizar os processos comunicativos para reforçar a proficiência linguística e assim evitar que a linguagem desencadeie um evento trágico”, explica a doutora em Letras Aline Pacheco, que integra o núcleo de pesquisa HFACTORS. 

Professora do curso de Ciências Aeronáuticas, ela explica que, quanto mais se investiga acidentes, mais se chega à conclusão de que a consciência é chave na hora de se comunicar. “Se a pessoa, quando está interagindo, tem a consciência das implicações do que vai falar e que ela pode não estar sendo bem entendida, vai observar a reação do interlocutor”, afirma. Por esse motivo, a pesquisadora entende que o trabalho com o uso da linguagem nos contextos complexos impacta na questão da segurança

Pelo fato de caracterizar todos os momentos do processo, a comunicação pode ser compreendida de uma maneira muito genérica. “Tudo pode ser atribuído a questões comunicativas, mas quando temos uma perspectiva, partindo da investigação da linguagem, conseguimos ter percepções diferentes”, ressalta. 

Nesse sentido, a pesquisa dessa área procura reconhecer o que deve ser comunicado, a quem, e usando que tipo de conhecimento. “Às vezes, são informações tão básicas, que podem ser deixadas de lado”, declara. 

Utilizando essa disciplina para pesquisas em conjunto com outras áreas, é possível fazer um diagnóstico e traçar um plano para não deixar falhas na comunicação. “Quando temos um cenário desenhado sobre como as operações acontecem, podemos descrever os fenômenos comunicativos num determinado contexto. Assim, temos uma ideia do que é pressuposto em termos de linguagem e o que é preciso ser comunicado para que a operação ocorra de maneira mais segura.” 

Um exemplo de aplicação é a criação de fraseologias específicas, compartilhadas entre os participantes da dinâmica comunicativa. Por exemplo, quando uma determinada frase, palavra ou expressão é usada para indicar a realização de um procedimento ou o aviso de alguma irregularidade. Também podem ser incluídos na rotina operacional códigos linguísticos de confirmação de recebimento ou entendimento, reconhecidos por todos os participantes da atividade. 

No diagnóstico e na aplicação de técnicas interventivas relacionadas à comunicação, a Linguística atua com outras disciplinas dentro do núcleo de pesquisa HFACTORS, entre elas estão Engenharia de Gestão e Conhecimento, Engenharia de Resiliência, Sociologia, Serviço Social e Psicologia. 

Assista ao vídeo da professora falando sobre o assunto no nosso canal no YouTube

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Pesquisador do HFACTORS apresenta pesquisa sobre segurança operacional na Suécia

Mesmo com um elevado número de regras e procedimentos fiscalizados por agências reguladoras, as organizações com alto nível de complexidade não estão livres de sofrer catástrofes. O coordenador do curso de Ciências Aeronáuticas da PUCRS, Lucas Bertelli Fogaça, que é integrante do núcleo de pesquisa HFACTORS, identificou, em sua tese de doutorado apresentada em 2021, controvérsias nas relações entre trabalhadores e os artefatos do ambiente laboral. O estudo foi apresentado na segunda semana de junho na Universidade de Lund, na Suécia. 

“Da mesma forma que procedimentos são utilizados para estruturar o trabalho, a variabilidade inerente ao campo implica em adaptações constantes para que o trabalho normal possa ser realizado”, explica, lembrando que esse é um dos exemplos de dualidades observadas na indústria de óleo e gás, utilizada como campo para a pesquisa, que também trouxe exemplos de outros setores, como o aéreo. O trabalho desenvolvido por Fogaça faz parte do projeto Integração de Fatores Humanos e Resiliência para o Fortalecimento da Cultura de Segurança na Indústria de Óleo e Gás, conduzido pelo núcleo HFACTORS, que é vinculado à Escola Politécnica em parceria com a Escola de Negócios da PUCRS.  

Fogaça dá exemplos de acidentes ocorridos logo após comemoração de elevados níveis de conformidade relacionados à prevenção de riscos por auditorias externas, como o desastre em Macondo no Golfo do México. A explosão de uma sonda de perfuração ocorreu no dia seguinte à celebração de um relatório com excelentes resultados de segurança. Foram 11 mortes, além de derramamento de óleo, que representou um enorme desastre ambiental. “Os eventos da barragem de Mariana e da Air France 447 também ocorreram em cenários parecidos, mesmo com elevadíssimos níveis de compliance. Isso mostra, em retrospecto, que a segurança e conformidade não andam necessariamente de mãos dadas.” 

Utilizando uma abordagem sociológica, ele observou, em diálogos no campo, em circulares, manuais e procedimentos, como as dinâmicas operacionais e de gestão ocorrem. “A tese se propunha a fazer a captura de negociações e reconciliação de diferentes metas que ocorrem cotidianamente, iluminando como os procedimentos, a regulação e os treinamentos, por exemplo, não são neutros, mas determinam o modo de agir”, ressalta.  

Hiperburocratização das organizações 

Outro ponto discutido é a tendência de proteção legal das grandes empresas, que implica na criação de inúmeros documentos, centenas de páginas de prescrições e procedimentos para serem conhecidos e assinados pelos colaboradores. Assim, a organização procura se blindar de implicações legais.  

As empresas estão entrando em uma fase de hiperburocratização e autojustificação para não serem penalmente responsabilizadas. “Isso acaba, muitas vezes, interferindo com os objetivos de melhoria do sistema da gestão de segurança operacional, redirecionado para a busca de culpados”, reflete o professor e pesquisador. O acúmulo incremental de novas regras e legislação que precisam ser atendidas impacta diretamente no volume de trabalho, que acaba ficando desproporcional e afetando a atividade fim, alcançando diferentes elementos das estruturas organizacionais.  

“Em um exemplo que discutimos na apresentação na Suécia, observamos um acréscimo de quase cinco vezes no volume de material requerido para formar um instrutor de voo nos últimos 10 anos. A maior parte – mais de dois terços deste material – é voltado hoje para proteção legal e não para a segurança da operação aérea em si”, diz.  

Laboratório de aprendizado em Lund 

A apresentação de parte da tese de Fogaça ocorreu no laboratório de aprendizado em Fatores Humanos e Segurança de Sistema, na Universidade de Lund. Este foi o primeiro encontro presencial do grupo desde o início da pandemia de Covid-19. O decano da Escola de Negócios e coordenador Científico do HFACTORS, Éder Heriqson, é um dos professores do curso voltado a Fatores Humanos na instituição sueca. Ele também participou das atividades desenvolvidas em junho com o orientando Fogaça, quando foram discutidos temas como ética, aprendizagem organizacional, cultura justa e cultura de segurança.  

Pesquisadores de várias partes do mundo, representando diversos segmentos, discutiram as limitações e saídas para a segurança operacional. “Os outros participantes debateram situações semelhantes em diferentes indústrias como nuclear e saúde, dedicando suas pesquisas a melhorar estes sistemas e encontrar equilíbrio entre produção, proteção e conformidade em sistemas complexos e dinâmicos”, argumenta Fogaça.  

Para ele, é muito difícil trabalhar com modelos pré-estabelecidos, sem considerar as especificidades de cada ambiente e a participação de representantes do meio estudado.  “O oferecimento de modelos e frameworks prontos não dão conta da dinamicidade destes campos. Por este motivo, nossa abordagem envolve cocriação. Nos dedicamos a ampliar as percepções em campo para permitir que caminhos emerjam do campo”, declara. Neste contexto, segundo Fogaça, o pesquisador nunca superará os repertórios e a experiência dos trabalhadores em seus próprios ambientes laborais.   

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Cultura Justa: responsabilidade compartilhada para garantir aprendizado nas organizações

Crédito: Unsplash

Os processos de gestão, de administração e também as condutas esperadas dos membros de uma determinada organização fazem parte de uma cultura local, a qual rege boa parte das dinâmicas nos ambientes de trabalho. Quando as práticas são pautadas por um sistema de responsabilidade compartilhada entre os trabalhadores, os reguladores e a gestão, procurando gerar aprendizado, confiança e cooperação, isso é chamado de cultura justa.

As pesquisadoras da equipe do Serviço Social do núcleo HFACTORS Beatriz Gersheson, Kathiana Arend e Inês Amaro explicam que esse conceito tem relação com a maneira que os sistemas respondem aos comportamentos de seus colaboradores. Se algo “dá errado”, por exemplo, o objetivo é aprender por meio da participação e da compreensão das atividades e responsabilidades.

A cultura justa engloba uma ampla gama de situações em que seus princípios podem ser considerados e aplicados para a melhoria de todos os processos organizacionais, segundo as pesquisadoras. Elas entendem que, para se chegar a um modelo de cultura justa, é necessária a participação dos envolvidos na organização. Uma das ações é a transformação da comunicação para evitar assimetrias de poder e, assim, reduzir também práticas retributivas, com objetivo de punição.

As práticas devem ser orientadas por processos democráticos e de responsabilização, ainda de acordo com a equipe do Serviço Social. Implica que haja, necessariamente, uma mudança de olhar e das perguntas que movem os processos.

Segurança organizacional

À medida em que a cultura de segurança das organizações incorpora esta racionalidade, o foco passa a ser nas necessidades e na obrigação em seguir uma abordagem colaborativa entre as pessoas direta e indiretamente afetadas por um incidente que causou ou possa causar dano. Para as pesquisadoras, esta é a base da mudança.  

A aposta em uma cultura justa restaurativa – que visa a reparação dos danos e responsabilização dos atos – oferece a possibilidade de ampliação da segurança nas organizações, fortalecendo a atuação dos trabalhadores. Eles podem participar ativamente do monitoramento do local de trabalho e estar envolvidos nos esforços para a melhoria da segurança organizacional.

Mobiliza ainda uma infraestrutura de aprendizagem contínua para prevenir a exclusão nas relações de trabalho, orientando-se por processos justos e inclusivos, intimamente associados à qualidade de interação e comunicação nas relações de trabalho. Assim, são cultivados espaços em que os trabalhadores possam ser ouvidos e tratados com respeito

O processo para consolidação da cultura justa ainda deve contar com aprendizagem coletiva e colaborativa, rompendo com os processos restritivos à culpabilização e à penalização. Da mesma forma, as assistentes sociais observam importantes a educação corporativa com o objetivo de desenvolver a liderança e a comunicação em nível interpessoal e intergrupal. Tudo isso privilegia a construção de competências comportamentais como escuta ativa, empatia, confiança e trabalho em equipe.

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Live provoca questionamentos sobre Fatores Humanos e segurança organizacional

Em evento realizado pelo núcleo de pesquisa HFACTORS, o tema do erro humano foi tratado no contexto da segurança das organizações e gerou diversas perguntas e comentários do público. A live, transmitida pelo YouTube da Pucrs na semana passada, contou com os professores Eduardo Giugliani e Eder Henriqson, além do engenheiro de petróleo da Petrobras José Carlos Bruno.

Entre as questões feitas a eles, estavam dúvidas sobre pesquisa na área, dificuldade de lidar com pessoas no mercado de trabalho e a abrangência da legislação trabalhista. Para esclarecer todos os temas, Bruno respondeu as perguntas que não puderam ser feitas no tempo da live.

Por que é tão difícil tratar pessoas como pessoas?

José Carlos Bruno: Corre uma lenda que diz que engenheiros seriam apaixonados por coisas e não por pessoas. Portanto, como as atividades de alto risco são também atividades de engenharia, essa seria uma condição “natural”. Não compactuo com essa ideia, mas claro que “cuidar” das coisas permite aos engenheiros construir os sistemas altamente tecnológicos que dispomos. Há diversos outros fatores que influenciam a forma como ainda hoje abordamos segurança, maciçamente fundamentada na crença de que as pessoas são um problema que ameaça a integridade dos nossos sistemas robustos e intrinsicamente seguros. As pessoas erram e erram muito. Um horror! São pouco confiáveis esses humanos! Ora, mas se errar é humano, por que continuamos culpando as pessoas, seres humanos, quando elas erram? Por que continuamos usando pessoas como barreiras, muitas vezes a principal barreira, nos tais sistemas que imaginamos quase perfeitos se elas são tão frágeis? Por isso é que em todas as oportunidades que temos de refletir sobre isso com as nossas lideranças, sobre como então podemos melhorar o desempenho humano, a primeira ideia que nos vem à mente é a de que devemos de uma vez por todas parar de culpar as pessoas por simplesmente serem humanas.

É prevista alguma ação mais focada na fase de projeto de instalações da indústria de Óleo & Gás? Como as questões organizacionais (estrutura, sistemas de remuneração etc.) estão sendo consideradas nos projetos de pesquisa?

A incorporação dos princípios e conceitos de fatores humanos, sobretudo em organizações tão complexas como no caso da indústria de petróleo, depende fundamentalmente de uma mudança de modelo mental, da adoção de uma nova filosofia alicerçada no melhor aproveitamento das pessoas como aquilo que elas sempre foram, a solução para os problemas naturalmente existentes no seu enfrentamento diário para a realização do trabalho. E é a partir da construção de um ambiente de participação, baseado na confiança como sua pedra fundamental, que será possível aprender com o trabalho normal, identificando os problemas do trabalho e corrigi-los de forma proativa, retroalimentando toda a organização em um verdadeiro processo de melhoria contínua de seus projetos, processos e sistemas. Mas não é uma tarefa fácil, longe disso. Há muitos elementos básicos que precisam ser plantados e permanentemente regados para que venham a dar frutos e sustentem a longa jornada que temos pela frente, como, por exemplo, aprender a lidar com as más notícias para que possamos aprender com elas. Nosso dia a dia não é um mar de rosas, repleto de boas notícias, como muitos podem imaginar. E sim, à medida que formos aprendendo, será possível enxergar de forma bem mais clara as diversas inconsistências existentes entre a nova abordagem proposta por fatores humanos e o que hoje ainda praticamos, quase que dogmaticamente, na indústria. Pode ter certeza de que ainda há um abismo entre o modelo mental predominante nas indústrias consideradas seguras, como é o nosso caso, e aquele das atividades ditas ultra seguras, como indústria nuclear e aviação comercial, por exemplo.

Alguns estudos mais recentes têm demonstrado que as habilidades das pessoas – técnicas e não-técnicas – contribuem para um trabalho mais seguro. Como isso se relaciona com Fatores Humanos? E que outros fatores estão relacionados com a segurança a partir da perspectiva de Fatores Humanos?

Sem dúvida alguma, a maior qualificação das pessoas é um elemento importante em qualquer sistema de trabalho. O cuidado que temos que ter é o de não acabarmos transformando essa abordagem em mais uma forma de “empurrar” toda a responsabilidade pela segurança de volta para o trabalhador lá na linha de frente. Por isso, é fundamental sempre pontuarmos a importância do desenvolvimento das nossas habilidades como algo importante, mas sobretudo reconhecendo tratar-se apenas de mais um elemento, dentre tantos outros, que precisa estar sempre conectado a um contexto, a um sistema muitas vezes complexo. Da mesma forma, por exemplo, quando de repente estamos falando de resiliência no nível do indivíduo, e não do sistema, o que pode acabar virando mais uma forma rebuscada de responsabilização do indivíduo.

Atualmente, qual a importância do tema de Fatores Humanos para a indústria de óleo e gás?

A indústria parece que finalmente acordou para a importância do tema fatores humanos. Sobretudo porque percebeu que não há mais como continuar fazendo mais do mesmo. O modelo tradicional de comando e controle, em que a desconfiança dá o tom, chegou ao seu limite. O autor Sidney Dekker pontua que a indústria de óleo e gás parece ter alcançado o seu “sweet spot”, o ponto a partir do qual mais regras e controles não necessariamente trazem mais segurança. Assim, para que possamos continuar evoluindo em segurança – e há ainda muito a progredir, apesar dos resultados que temos alcançado – é fundamental incorporarmos um novo repertório como o que é proposto por fatores humanos. Não será fácil, já que renunciar ao controle a partir da construção de ambientes psicologicamente mais seguros com base na confiança certamente encontrará muita resistência entre um bom número de gestores formados num outro tipo de contexto. Por isso a ideia de uma jornada.

Como o corpo gerencial de organizações de alto risco está sendo apresentado aos conceitos de Fatores Humanos? A aceitação e compreensão tem sido positiva?

Este é um dos maiores desafios, se não o maior, para qualquer organização que pretenda investir na abordagem de fatores humanos: como engajar a alta liderança. Sem dúvida, é o primeiro passo desse processo. Felizmente, a partir do aprendizado de mais de cinco anos na pesquisa de fatores humanos, especificamente, com a indústria de óleo e gás, foi possível desenvolver o que estamos chamando de Laboratório de Fatores Humanos, uma forma estruturada que dá aos gestores de topo a oportunidade de conhecer os principais conceitos e princípios de fatores humanos em um ambiente de debates e muita reflexão. O resultado tem sido bastante auspicioso. Mas é preciso avançar ainda mais na sedimentação dos conceitos e este será, sem dúvida, o grande trabalho que teremos pela frente já em 2022.

Quais as perspectivas sobre a inclusão do tema Fatores Humanos às Legislações Trabalhistas Brasileiras?

Essa é uma discussão que está se iniciando e que extrapola em muito a capacidade das organizações de fazer acontecer. Sem dúvida, é fundamental o envolvimento de toda a sociedade, já que muita coisa depende de uma profunda revisão no modelo mental vigente. E aí estão incluídos todos os agentes públicos, como Ministério do Trabalho, agências reguladoras, congresso, judiciário e por aí vai. Na indústria de petróleo, minha área de atuação, será muito importante a atuação das diversas entidades como o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) e outras que representam as empresas e seus profissionais junto a esses stakeholders.

Temos uma ampla gama de técnicas para avaliar quando as coisas dão errado (investigação de acidentes). Que ferramentas temos para uso pela força de trabalho para avaliar quando as coisas dão certo?

Quando pensamos em “fazer” segurança para as pessoas, logo nos vem à mente a ideia de que devemos aplicar alguma ferramenta. Isso é normal, dado o conjunto de crenças e premissas construídas ao longo de décadas. Mas, a partir do momento que passamos a compreender que segurança é algo que se constrói com as pessoas, num processo permanente de interação, dia após dia, começamos a perceber que o verdadeiro aprendizado vem do trabalho normal, como ele é realizado na prática. A partir disso, podemos identificar, em conjunto com o trabalhador, que é quem realmente conhece as limitações existentes no sistema, os problemas do trabalho e eliminá-los de forma proativa e sustentável. Aprender com o trabalho normal não requer qualquer ferramenta. Mas, se quisermos extrair aprendizado a partir de algum resultado, como quando as coisas dão certo, por exemplo, já existem algumas técnicas que vem sendo aplicadas em maior ou menor escala a depender no nível de maturidade da organização, como é o caso do “debriefing”, um momento reservado no pós- tarefa onde a equipe discute o que aconteceu e registras os pontos críticos e as oportunidades de melhoria para retroalimentar o sistema.

Gostaria que falassem um pouco sobre o tema trabalho imaginado x trabalho realizado, sob a perspectiva do Hearts and Minds.

A partir do momento que nossas lideranças desenvolvem a habilidade de discorrer sobre o conceito de trabalho imaginado x trabalho realizado, muito do que fundamenta abordagens do tipo Hearts and Minds deixa de fazer sentido. Quando se compreende que é o trabalhador, através das adaptações necessárias ao enfrentamento dos problemas diários para a realização do trabalho, que consegue reconciliar aquilo que é possível fazer com o que é desejável fazer e, com isso, manter o sistema funcionando com segurança, qualidade, produtividade e eficiência, toda a lógica de que é preciso sensibilizar o trabalhador para que ele passe a atuar como uma barreira de segurança cai por terra. Nós já somos assim! Quando um trabalhador “comete” um “desvio”, uma “violação”, ele está, na imensa maioria das vezes, buscando uma forma de ajudar a organização a alcançar os resultados esperados.

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Professores do HFACTORS lançam livro sobre resiliência na Era Digital

Uso de tecnologias para melhorar a segurança no futuro é um dos temas do livro Resilience in a Digital Age: Global Challenges in Organisations and Society. A publicação da editora Springer reúne várias abordagens sobre o assunto trazidas por especialistas mundiais em resiliência. Como organizadores, a obra tem dois pesquisadores do HFACTORS, os professores Éder Henriqson e Paulo Maurício Selig, além da fundadora e presidente da Associação do Capital Intelectual, Florinda Matos.

A resiliência é tratada pelos três como a chave para o futuro. Já as pessoas, segundo eles, estão na base das transformações. O livro fornece ainda exemplos e estudos de caso sobre resiliência e novos modelos de negócios, além de destacar a importância de construir organizações resilientes para se adaptarem a eventos ou crises inesperadas.